Al Berto
Al Berto, pseudónimo de Alberto Raposo Pidwell Tavares, nasceu em Coimbra em 1948 e faleceu em Lisboa em 1997. Para além de pintor e editor, foi um dos mais originais poetas portugueses das últimas duas décadas do século XX.
3ª Edição de Horto de Incêndio pela Assírio & Alvim | Fotografia de Al Berto por Paulo Nozolino
Recado
ouve-me
que o dia te seja limpo e
a cada esquina de luz possas recolher
alimento suficiente para a tua morte
vai até onde ninguém te possa falar
ou reconhecer - vai por esse campo
de crateras extintas - vai por essa porta
de água tão vasta quanto a noite
deixa a árvore das cassiopeias cobrir-te
e as loucas aveias que o ácido enferrujou
erguerem-se na vertigem do voo - deixa
que o outono traga os pássaros e as abelhas
para pernoitarem na doçura
do teu breve coração - ouve-me
que o dia te seja limpo
e para lá da pele constrói o arco de sal
a morada eterna - o mar por onde fugirá
o etéreo visitante desta noite
não esqueças o navio carregado de lumes
de desejos em poeira - não esqueças o ouro
o marfim - os sessenta comprimidos letais
ao pequeno-almoço
Al Berto
Assírio & Alvim 1997
http://assirioealvim.blogspot.com/
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